Alijó, Maio de 2025. Final de tarde e as nuvens começam a ficar cada vez mais espessas, o que parece ir ao encontro da previsão de chuva para as próximas horas. Acabada de sair de um trabalho de fotografia que me tinha ocupado o dia todo, acho por bem espreitar o mapa e ver se tenho por lá algum campo sinalizado à espera de uma visita. A vontade é escolher meia dúzia, mas a hora avançada dita que só posso visitar três.
A primeira paragem é em Cadaval, uma pequena aldeia entre a A4 e a regional 15, que liga o Pópulo a Murça. Basta desviar-me ligeiramente da estrada principal para encontrar um pelado daqueles bem simples, típico de localidades mais pequenas e despovoadas, só com duas balizas e cercado por uma parede de blocos de cimento. A bola parece já não rolar há muito por estas bandas. A vegetação vai crescendo aqui e ali e, em frente a uma das balizas, ergue-se uma enorme retroescavadora. Olhando para o cenário, tudo me leva a crer que a presença da dita máquina neste terreno já faz parte do quotidiano da aldeia. Do outro lado, no meio do campo, três rapazes queimam lixo numa fogueira. Nada faz sentido e tudo faz sentido, ao mesmo tempo.
Sigo para a próxima paragem em busca de mais um recinto. Por lá e a julgar pelas imagens do Google Maps, espero encontrar um sítio bem diferente do campo de futebol de Cadaval. Entro na autoestrada. Começa a chover de tal forma que sou obrigada a reduzir para 70. Pondero seguir caminho até casa e voltar num outro dia, mas a tentação de (pelo menos) espreitar e ver se vale a pena regressar sobrepõe-se.
Vinte minutos depois chego ao destino e percebo que efectivamente este campo já reúne os padrões típicos de um campo de um clube da distrital: há bilheteiras, balneários, sintético e a clássica rua do campo de futebol. Durante alguns segundos, as minhas sapatilhas dizem-me que o mais sensato é voltar um dia destes, mas o colorido da fachada ganha logo vantagem.
Lá vou eu, de guarda-chuva numa mão e câmara fotográfica na outra. A fachada é ainda mais bonita sem o filtro do vidro do carro. Tiro algumas fotos e volto ao carro, para contornar os muros do campo e ver se encontro mais uma razão para permanecer mais um pouco. Meio minuto depois dou por mim de boca aberta e a pronunciar baixinho um “não acredito”. Como é que alguém se lembrou de fazer isto? Quantas horas e pessoas foram precisas para dar forma a esta empreitada? Como é que, em tantos campos que já visitei, nunca tinha encontrado nada igual?
Muitas perguntas e muitas fotos depois – que mostrarei por cá numa próxima oportunidade – volto ao carro e sigo em direcção ao terceiro e último campo.
A chuva parece ter vindo para ficar e o céu escurece a cada minuto que passa. Alguns quilómetros depois chego a Mateus, a menos de cinco minutos do centro de Vila Real. O gps manda-me contornar a Casa de Mateus, por uma estrada estreita, de alcatrão. Encontro algumas casas, mas nada me leva a crer que vou encontrar por ali um campo de futebol. Começo a achar que estou perdida, mas continuo a seguir pelo caminho traçado no ecrã. Duas curvas mais à frente, o gps diz-me que estou a chegar ao meu destino. Corresponde, de facto. O campo de futebol de Mateus surge no horizonte, completamente ao abandono, mas ainda com alguns sinais que indiscutivelmente sinalizam a existência, em tempos, de um clube de futebol.
Nada sabia sobre o Sport Clube de Mateus até este dia. Uma breve pesquisa na internet fala de uma equipa amadora, fundada a 1 de Janeiro de 1926. Não existe muita informação online, à excepção de uma página de Facebook que nos diz que:
Infelizmente, os administradores cessaram actividade pouco tempo depois da criação da página, mas ainda nos deixaram três registos fotográficos do Sport Clube de Mateus:
Aprecio o edifício principal, ainda com os pés no alcatrão, mas não resisto a avançar pelo campo de terra batida para conseguir outra perspectiva do recinto. Pondero seguir pelo caminho estreito que circula o campo, mas rapidamente percebo que o melhor é ir pelo meio das quatro linhas. O terreno revela-se quase todo inundado e a progressão é feita a baixa velocidade. Os meus pés já se renderam completamente às condições climatéricas e a única preocupação neste momento é abrigar o equipamento fotográfico da chuva que continua a cair.
Um senhor idoso passa na rua situada mesmo junto ao campo e observa-me, curioso. Trocámos olhares e cumprimentamo-nos. Ele segue caminho, enquanto eu avanço pela vegetação cada vez mais densa na direcção dos bancos de suplentes. Ao longe pareciam bastante diferentes do habitual e são-no, de facto. Já me habituei a bancos de suplentes com formas muito diferentes e peculiares, sobretudo nos campos mais antigos, mas estes são particularmente interessantes. Sorrio e pergunto a mim mesma qual é a probabilidade de encontrar dois campos com pormenores tão únicos no mesmo dia.
Neste dia de Maio foi a primeira vez que fotografei para o Tostões debaixo de chuva. Não será o único certamente ou não tivesse eu percebido, neste dia, que há toda uma magia em registar um campo com esta luz.
Até breve,
Marta.








Vale (muito) a pena seguir
352 Football Festival
O 352 Football Festival regressa para a sua segunda edição, que vai ter lugar nos dias 12 e 13 de Julho, no Stade Henri Dunant, no Luxemburgo. O Futebol de Tostões vai marcar presença com a exposição “Futebol de Tostões: grassroots football & local heroes from Portugal”, que trará algumas imagens inéditas de campos de jogos nacionais. Vou ainda participar numa das quatro mesas redondas organizadas pelo festival, dedicada ao futebol popular, na companhia do Kilian Dephul, do Valentin L’ Arena e do Harlem Lamine, do Football Case Study, que vai moderar a conversa.
O programa é bem mais extenso e conta com um torneio de futebol, workshops, música, um mercado e mais três exposições. A informação detalhada sobre cada uma das actividades está a ser anunciada aos poucos pela organização na página do festival no Instagram.
Se estiveres por perto, é uma oportunidade única de viver a cultura do futebol. A entrada é livre.